Aeronave foi projetada para ser o melhor jato em sua categoria e colocar a Embraer no topo da aviação executiva. VEJA acompanhou sua estreia. Confira.
AGORA É NO AR - Foram 2 500 horas de testes no simulador antes da primeira decolagem. O jato traz inovações como o comando eletrônico por sidestick - Fotos: Divulgação e Manoel Marques
Na tarde da última terça-feira, 27, o comandante Mozart Louzada Júnior viveu uma experiência inédita. Em São José dos Campos, no interior paulista, Louzada comandou o primeiro voo de uma nova aeronave, o Legacy 500. Piloto aposentado da Força Aérea Brasileira, a FAB, na qual serviu por três décadas, ele trabalha para a Embraer há doze anos. Sair do chão pela primeira vez é um momento decisivo para a carreira de um novo modelo de avião. Resultado de seis anos de pesquisas e de um investimento de 750 milhões de dólares, o Legacy 500 foi concebido para ser o que os americanos definem como game changer - um modelo destinado a revolucionar a sua categoria. O grande diferencial tecnológico em relação aos concorrentes é a tecnologia fly-by-wire, sistema eletrônico que dispensa o uso de cabos e transmite digitalmente aos flaps, leme e outras partes móveis do avião as ordens que o piloto dá pelo sidestick na cabine. O sistema digital permite diminuir o peso do avião e, teoricamente, reduz o risco de falhas. Atualmente ele é usado nos jatos comerciais da Airbus e da Boeing. Os jatos executivos de longo alcance, como o Falcon 7X, da francesa Dassault, que custa 50 milhões de dólares, também voam com o sistema fly-by-wire. Alguns modelos executivos mais baratos usam o sistema de controle digital apenas para alguns comandos. O Legacy 500 será o primeiro modelo executivo de médio porte e preço entre 16 milhões e 20 milhões de dólares com digitalização total dos comandos. Antes da decolagem inaugural, o Legacy 500 passou por 2 500 horas de testes, ao longo de dois anos, no equipamento iron bird, um simulador que permite estudar e testar os controles de voo, os trens de pouso e todo o sistema hidráulico do avião, que também é submetido a testes de resistência estrutural.
A indústria aeroespacial é uma das mais competitivas do mundo. Entre os jatos executivos, a Embraer disputa mercado com a canadense Bombardier e as americanas Gulfstream, Cessna e Hawker Beechcraft, além da francesa Dassault. A Embraer ganhou espaço em 2008 com a primeira entrega do modelo Phenom 100, jato executivo para até oito passageiros. Um ano depois veio o Phenom 300, com formato ovalado, mais espaço interno e freios de carbono, ideais para pistas curtas. Com o Legacy 500, a Embraer vai oferecer uma opção aos compradores de jatos executivos médios porque a aeronave, além de possuir digitalização total dos comandos, é a única da sua categoria com cabine stand up, ou seja, alta o bastante para uma pessoa de 1,80 metro ficar de pé. A Embraer ainda tem o Lineage 1 000, o topo de linha, que briga com os jatos executivos intercontinentais.
Dois em cada três compradores desses aviões são empresas que utilizam as aeronaves como ferramenta de negócios, para transportar os seus executivos com maior agilidade e conforto, sem depender dos horários da aviação comercial. Apenas 5% dos compradores são celebridades. A Embraer tem como trunfo competitivo sua parceria com o grupo alemão BMW, encarregado da concepção do design interno do avião. Diz Marco Pellegrini, vice-presidente de operações de aviação executiva: “Fizemos pesquisas de mercado abrangentes e sabemos que oferecemos um jato com características só encontradas em modelos bem mais caros”.
Embora já apareça como a terceira força da aviação executiva, a Embraer é uma novata no segmento, com uma década de experiência. A americana Learjet, pioneira e hoje pertencente à Bombardier, está no mercado há meio século. A antiga estatal brasileira, privatizada em 1994, mantém preeminência na aviação comercial regional há alguns anos. Mais recentemente, decidiu entrar no mercado de jatos executivos para diversificar as suas vendas. Hoje, 20% do faturamento vem dessa divisão. A rigor seu primeiro modelo nesse segmento foi o Legacy 600, que estreou em 2002. Resultado da adaptação para o mundo executivo de um modelo originalmente destinado à aviação regional, o Legacy 600 não pode ser visto como o pioneiro de uma família de novos e competitivos jatos, como é o caso do Legacy 500. Diz Mauro Kern, vice-presidente de engenharia: “Nesse mercado, somos obrigados a identificar as tendências com quinze anos de antecedência”.
A adoção de novas tecnologias e a flexibilidade são fundamentais nessa competição. Isso fica cada vez mais evidente nas linhas de montagem. No caso do Legacy 500, pela primeira vez os engenheiros da Embraer - são 4 500 de um total de 17 000 funcionários - trocaram os extensos e pesados manuais de instruções em papel por tablets interconectados e capazes de exibir imagens tridimensionais. A eliminação dos manuais e a adoção dos tablets diminuíram em 40% o tempo mínimo de aprendizagem dos funcionários encarregados da fabricação dos novos modelos.
Como é natural na indústria de aviação, o trabalho nunca está completo. O voo inaugural da semana passada foi apenas o começo de uma nova bateria de testes. Até o fim de 2013, o comandante Louzada e sua equipe de trinta pilotos vão voar mais 2 000 horas no Legacy 500, que será exigido em decolagens, aterrissagens e voos nas mais diferentes condições atmosféricas. As perspectivas são favoráveis. Afirma Ronald Epstein, analista do setor aeroespacial do Bank of America Merrill Lynch: “O Legacy 500 será o modelo mais avançado de sua categoria com um preço competitivo”. Os primeiros compradores do Legacy 500, cujo número exato é um segredo industrial na Embraer, devem começar a receber seus jatos em 2014.
INOVAÇÃO - A adoção do tablet substituiu 120 000 páginas de manuais, reduzindo
o tempo de produção. Ao lado, o voo inaugural - Fotos: Divulgação
Fonte: Marcelo Sakate (Veja.com)