Processados na Justiça Militar (Auditoria da 11ª Circunscrição Judiciária Militar) por homicídio culposo, os militares, por meio de sua entidade de classe, alegam que já respondem como acusados do mesmo crime na Justiça Federal, na Vara Única da Subseção Judiciária de Sinop (MT).
Neste HC, eles se insurgem contra decisão da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que rejeitou conflito de competência suscitado pelo juiz federal de Sinop. A Turma endossou voto do ministro Paulo Gallotti, que se fundamentou no enunciado da Súmula 90/STJ, segundo a qual “compete à Justiça Militar processar e julgar o policial militar pela prática do crime militar e, à comum, pela prática do crime comum simultâneo àquele”.
A Febracta lembra que também a juíza auditora da 11ª Circunscrição da Justiça Militar, Zilah Maria Callado Fadul Petersen, inicialmente suscitou conflito de competência, porém acabou apreciando a denúncia, mas a rejeitou e declarou-se sob suspeição, afastando-se do caso.
Da mesma forma, conforme lembra a entidade, o Ministério Público Federal questionou a decisão do STJ por meio de Recurso Extraordinário no Supremo Tribunal Federal, mas o recurso não foi apreciado em seu mérito por ausência de pré-questionamento.
A Febracta alega que seria inconstitucional o julgamento de um fato civil por um tribunal de exceção, e violação ao princípio do non bis in idem (julgamento duplo pelo mesmo crime).
Ao contestar o verbete que da Súmula 90/STJ, invocado pela 3ª Seção daquela Corte para admitir o duplo julgamento, ela observa que aquele verbete se refere a crime cometido por policial militar. Ademais, contesta o enquadramento por crime militar, sustentando que se trata de “conduta praticada em serviço de controle de tráfego aéreo da aviação civil”.
“A missão de um controlador de tráfego aéreo civil é assegurar que aeronaves decolem e pousem em segurança”, observa. “A missão do militar é orientar voos para alvos, interceptações e ataques, situações bélicas excepcionais em que aeronaves e pilotos podem ser até sacrificados.”
Segundo ela, “em todos os países da Europa e da América e, nos demais continentes, em expressivas nações como Japão, Austrália, China, Índia, e mesmo em países onde se registra um volume pequeno de tráfego aéreo, a administração da atividade é conduzida por civis, sob estritas regras voltadas para a segurança dos que voam e são sobrevoados”.
“Neste campo”, assinala, “falhas são registradas e tornadas públicas, providenciando-se rápida disseminação das informações a elas relativas, como estratégia de prevenção, de modo a que não venham a se repetir”.
Em direção contrária a eles, segundo a defesa, “o Brasil alinha-se ao Togo, Gabão e Eritréia, confundindo a administração da aviação civil com a defesa do espaço aéreo, onde a lógica militar impõe sejam ocultadas falhas na atividade, porquanto representariam fragilidade bélica em face de possíveis inimigos”.
Assim é que o artigo 18 da Lei Complementar 97/1999, regulamentando o artigo 142, parágrafo 1º da Constituição Federal, que trata das atividades das Forças Armadas e de sua regulamentação, relaciona, entre as atribuições da Aeronáutica, a de “orientar, coordenar e controlar as atividades de aviação civil (inciso I do artigo 18) e a de “prover a segurança da navegação aérea”(inciso II).
Entretanto, em sentido contrário a essa disposição, o artigo 178 da CF, “que efetivamente dispõe sobre a ordenação do transporte aéreo, aquático e terrestre, está inserido no capítulo “dos Princípios Gerais da Atividade Econômica”, afirma a Febracta.
Erros não sanados
A entidade alega que, em virtude da dupla função da Aeronáutica, falhas (por exemplo de radar e de radiocomunicação), “todas conhecidas e relatadas por mais de uma década”, deixaram de ser corrigidas e já quase provocaram outros acidentes. E tais falhas são conhecidas, segundo ela, pelo menos desde 1996, quando o avião presidencial “Força Aérea 01” “envolveu-se em um incidente de quase colisão com um avião de passageiros”.
Segundo a Febracta, tais falhas “foram identificadas, registradas. Comunicadas ao Alto Comando (da Aeronáutica) e, de modo absurdo, nunca foram corrigidas”. Em função do relatório do incidente com o avião presidencial em 1996, a Febracta intentou, inclusive, uma Ação Penal de iniciativa privada subsidiária da pública, contra os comandantes da Aeronáutica.
Por outro lado, como o órgão responsável pela prevenção é também o órgão responsável pela investigação, conforme a entidade, os comandantes da Aeronáutica, aos quais ela responsabiliza, “não adotaram medida preventivas, a despeito de todas as informações relativas às falhas de que dispunham”. E questiona: “Como esperar que investiguem com isenção a si mesmos?”
Ela afirma, ainda, que também o Ministério Público Militar é omisso em relação aos crimes cometidos por oficiais da Aeronáutica. “Por tudo acima exposto, é de se entender que a tipificação das condutas dos pacientes, segundo a denúncia oferecida pelo Ministério Público, projeta-se sob licenciosa tolerância à flagrante inconstitucionalidade de exercício de atividade econômica por Força Armada”, afirma, para concluir que “não há qualquer previsão legal para a especificidade da matéria, no Código Penal Militar”.
Por fim, a Febracta pede a suspensão da ação em curso na Justiça Militar e de todos os atos persecutórios em desenvolvimento naquela esfera judicial, até o julgamento do mérito do HC pelo Supremo. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
HC 105.301
Fonte: Revista Consultor Jurídico