Serviço foi criado depois de queda de helicóptero em 2004.
Sindicalista diz que trabalhadores temem represálias depois dos relatórios.
Enterro de uma das vítima de queda de helicóptero na Bacia de Campos, no Cemitério de Rio das Ostras (Foto: Fabio Rossi/Agência O Globo)
Desde o acidente de 2004, com um helicóptero na Bacia de Campos que provocou a morte de cinco pessoas , o Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro NF), tem incentivado os funcionários que vivem embarcando e desembarcando das plataformas que registrem qualquer irregularidade percebida nas aeronaves.
O diretor-geral do Sindipetro NF, José Maria Rangel, não revela o número de registros, mas informa que a maioria relata problemas como vazamento de óleo, trepidação e barulhos estranhos nos helicópteros.
Rangel diz que a maioria dos funcionários – principalmente, os prestadores de serviço – teme sofrer represálias pelas reclamações, mesmo que, no preenchimento do formulário do Relatório de Perigo (Relper), o reclamante não precise se identificar. Os registros, afirmou ele, são enviados à gerência de transportes aéreos da Petrobras para que sejam tomadas as devidas providências.“
A gente vem tentando intensificar e conscientizar as pessoas da necessidade de registrar as anormalidades nas aeronaves. Se a gente consegue identificar pequenos incidentes tem condições de tentar evitar um grande acidente”, disse Rangel.
Três tentativas até decolar
Num relato de 31 de janeiro, um instrumentista da Petrobras contou que teve de mudar de aeronave duas vezes para chegar a uma das plataformas da Bacia de Campos. Primeiramente, o seu vôo, inicialmente marcado para 30 de janeiro, foi cancelado, depois de uma semana de chuva intensa na região. No dia seguinte (31), os passageiros já estavam no helicóptero, um Super Puma, fazendo o check-list para decolar do Aeroporto de São Tomé, quando uma outra aeronave com os botes inflados chegou. Para a realização da operação de socorro todos foram desembarcados.
Segundo o relato do funcionário, a impressão é de que a correria era para compensar os dias parados por causa da chuva. Ele contou que foram informados que embarcariam em outro helicóptero que acabara de chegar (sem respeitar o intervalo mínimo de 30 minutos entre um vôo e outro).
Ao entrar na segunda aeronave, o piloto detectou pelos instrumentos falha na bateria. Novo desembarque, autorização para almoçar e a conversa entreouvida de que o instrumento é que estava errado. E todos embarcaram novamente no mesmo helicóptero. No final do documento, o funcionário escreveu:
“Tenho de agradecer ao Senhor. Quase usei meu direito de recusa para não embarcar”. Rangel diz que algumas das propostas do Sindipetro NF foram acolhidas pela Petrobras. A empresa, segundo ele, estaria começando uma obra no aeroporto de Macaé para evitar que os helicópteros tenham de decolar na vertical, o que exige que as turbinas estejam na potência máxima, mas ainda não acatou a obrigatoriedade de uso de casacos, camisas ou macacões laranja para os passageiros de aeronaves.
“Desde o final do ano passado, o sindicato distribuiu camisetas laranja para os passageiros. É a cor ideal para quem vai voar, pois facilita muito a identificação, em caso de acidentes no mar”, explicou Rangel.
Sobrevivente de 1986
O acidente com o Super Puma, ocorrido na última terça-feira (26), fez o instrutor de mergulho Carlos Roberto de Souza, o Roberto Velho, de 70 anos, lembrar do acidente que sofreu em 1986, quatro anos após ter perdido 14 colegas na explosão de um helicóptero, na Bacia de Campos. Na época, Roberto Velho, a cada 14 dias tinha de embarcar numa aeronave até a plataforma onde trabalhava, a S-11, como mecânico de mergulho em grande profundidade.
“Depois da explosão de 82, sempre que saía de casa falava com a minha mulher que tinha a sensação de que iria cair no mar. Mas não tinha medo. Até que um dia aconteceu. Quando embarquei, um colega que tinha acabado de chegar reclamou da aeronave. Desde o acidente, a gente tinha apelidado aquele tipo de helicóptero de “Mão Branca”, que na época era o nome de um justiceiro que matava todo mundo na Baixada Fluminense”, comentou Roberto Velho.
Ele embarcou assim mesmo e logo na decolagem, ouviu piloto e co-piloto discutindo como fazer para contornar o problema de uma turbina que não estava funcionando. Eles tentaram uma manobra, que não deu certo e o helicóptero fez um pouso forçado a pouco mais de 10 metros da plataforma. Como um dos três flutuadores não funcionou, o comandante decidiu manter o rotor funcionando até a água atingir a cintura dos 14 passageiros, na cabine. Quando desligou o motor, a aeronave adernou para o lado sem o flutuador e começou a afundar lentamente.
“Muita gente se desesperou. Com a minha experiência de mergulho, estava me sentindo mais seguro na água. Inflamos os dois botes, o socorro chegou rápido e conseguimos salvar todo mundo. Um dos colegas, que não sabia nadar, já estava se afogando, quando foi levado para a superfície por uma pá da hélice do rotor principal. Na época questionei muito a atitude do piloto, mas só depois nos informaram sobre o problema com o flutuador”, contou o mergulhador, lembrando que o helicóptero foi içado logo em seguida.
Medo, Roberto Velho diz que nem teve tempo de sentir. Afinal, sete dias depois, estava embarcando mais uma vez no “Mão Branca”, para voltar à plataforma. E continuou na rotina de vôos até 1994.
“Viajo muito de avião, mas confesso que ando temeroso. Hoje, os equipamentos são mais modernos e seguros. Mesmo assim, é bom lembrar que em mecânica quando uma peça falha não avisa antes”, ressaltou Roberto Velho.
Fonte: G1