Era uma manhã ventosa e com neve de início de inverno, e lá estava eu em uma ponta de terra que se projetava para a Baía de Kachemak, na cidade de Homer, Alasca, cercada por maravilhas naturais. Ou foi o que me disseram. O campo de gelo de Harding, topos de montanha irregulares abrigados em geleiras interconectadas, ao nordeste. A 16 quilômetros de distância estavam os rios onde, na primavera, ursos entravam nas águas, praticamente posando para fotos enquanto pescavam salmões na desova.
Mas no Alasca, um vasto Estado cobrindo 1,7 milhão de quilômetros quadrados, grande parte do terreno não é acessível por estradas. Por meios convencionais, há um limite até onde o turista pode chegar. Parada na ponta do Homer Spit, eu tinha chegado ao fim da estrada: a poucos metros à frente, o pavimento despencava no mar.
Felizmente, há outra opção: pelo ar.
Enquanto estava no Alasca para entrevistar pessoas vivendo em áreas remotas para um artigo, eu aprendi quão vital é a viagem aérea para se chegar a pontos inacessíveis por estrada. Eu também descobri que é a melhor forma de ver as muitas vistas deslumbrantes do Estado – uma descoberta que milhares de visitantes estão fazendo, à medida que a proliferação de pilotos no Alasca levou a uma série de passeios aéreos.
Conhecidos como voos panorâmicos, esses passeios – em pequenas aeronaves robustas capazes de pousar em terreno irregular – ajudaram a abrir o Alasca para o viajante comum. Do ar, a rara vista da parte traseira de uma geleira se torna democrática, não mais reservada aos entusiastas de esportes radicais capazes de escalar suas encostas geladas. Assim que se pousa, animais reclusos entram em foco, riachos para pesca de difícil acesso ficam a poucos passos de distância.
“Nós temos apenas cinco estradas”, disse Norm Lagasse, diretor do Alaska Aviation Heritage Museum, do outro lado de um Estado com mais que o dobro do tamanho do Texas. O norte de Anchorage e Fairbanks, por exemplo, com a exceção dos trenós puxados por cachorros, é um terreno cujo acesso só é possível por aeronaves, disse Lagasse. “Não há estrada, ferrovia, não há infraestrutura de transporte baseada em solo”, ele acrescentou.
Assim, o Alasca conta com cerca de um piloto registrado para cada 58 habitantes, e 14 vezes mais aviões per capita do que o restante dos Estados Unidos, segundo informação online reunida pelo Departamento dos Transportes. Lagasse disse que os pilotos pioneiros realizaram seus primeiros voos pelo interior em 1913.
Os navios de cruzeiro também alegam fornecer acesso único ao Alasca, mas a vista do convés revela poucos detalhes – nenhuma visão do alto das criaturas que perambulam pelos picos, como as lanosas e brancas ovelhas Dall e carneiros quase tão grandes quanto burros. E apesar de que por navio você pode flutuar próximo do pé de uma montanha, você não consegue ver as joias escondidas em seus penhascos: os lagos coloridos dos vales, com um brilho esverdeado causado pela “farinha rochosa”, os minérios moídos oriundos do derretimento das geleiras que ficam em suspensão no lago.
Há 304 operadores de linhas aéreas comerciais no Estado, segundo Kathie Anderson, da Alaska Air Carriers Association, que representa as empresas do setor aéreo local. Elas incluem proprietários de pousadas que transportam os hóspedes até seus hotéis remotos, guias de viagens de caçadas a ursos e pequenas companhias aéreas de passageiros.
As melhores vistas, me disseram, se apresentam na primavera, quando você pode avistar os ursos abaixo de você e pousar para tirar fotos. Zack Tappan, piloto-chefe da Homer Air, sobrevoa as chaminés de até quatro vulcões ativos nas viagens às áreas de procriação de ursos. Após pousar na costa da Baía de Kachemak, oposta a Homer, Tappan guia os visitantes a até 100 metros de um tranquilo urso marrom. ”Eu não diria que eles têm um relacionamento conosco, mas eles já nos viram o suficiente para nos entenderem”, ele disse.
Mas mesmo no inverno você pode ver pessoalmente esses lagos verdes como eu, com voos panorâmicos fornecidos pela resposta do Alasca ao ônibus de turismo: um bimotor Piper Navajo que atravessa a Passagem do Lago Clark. Decolando de Anchorage na direção da cidade de Port Alsworth, você vê um Alasca destilado, disse Glen Alsworth Jr., que dirige a Lake Clark Air e, juntamente com seu pai, é uma espécie de lenda aeronáutica local. “Você vê as torres de perfuração de petróleo e a parte industrial do Alasca, assim como entra na transição para a natureza selvagem, onde tudo ainda é dominado pelas geleiras”.
Glaciares circundam o Northwestern Fjord, no AlascaO que não me ocorreu é que toda essa beleza tem um preço: os caprichos da natureza. O plano de voo do avião o coloca à mercê das turbulências atmosféricas, apesar de não parecerem incomodar em nada os pilotos. Assim como os povos nativos do Alasca tem múltiplas palavras para neve, os pilotos têm múltiplas descrições para turbulência. Eu acredito ter experimentado todas. Eu até mesmo reconheci alguns dos termos. Guinada, quando o avião dança em seu curso quando uma rajada de vento atinge uma asa, depois a outra. Ar turbulento, quando o avião trepida em um céu limpo que repentinamente parece uma estrada de terra esburacada.
“Quando está bonito, é realmente bonito, mas quando o tempo não está bom, é traiçoeiro”, disse Lagasse, que voou pela Força Aérea por 22 anos e continua voando por diversão.
Mas enquanto o avião trepidava no ar, eu depositei minha confiança na calma do piloto, quase de modo empresarial. Glen Alsworth Sr. já passou mais de 24 mil horas no ar e sua equipe é bastante experiente. Nesse dia, nós voamos sobre os picos, mas a Lake Clark Air é hábil em conduzir pequenos e robustos aviões Stinson por entre os flancos das montanhas para pousar em áreas rasas de cascalho no meio dos rios. Apesar da altitude mais baixa permitida pela Administração Federal de Aviação ser de 150 metros, em áreas não habitadas os aviões podem descer mais baixo.
Com rodas robustas, os pequenos aviões de mata podem pousar em praticamente qualquer superfície plana – trechos de neve entre abetos ou trechos de areia. Pousos em praias de lagos são comuns em viagens de pescar e soltar na primavera, quando o salmão ártico e a truta arco-íris são a atração. Para viagens em que a mata e as rochas impedem o pouso, Alsworth utiliza hidroaviões para pousar na água.
Apesar dos ventos terem impedido um pouso audacioso desta vez, minhas vistas do alto foram suficientes. Os Montes Chigmit foram uma vista estupenda; a passagem entre eles era uma versão gelada do Grand Canyon. Os picos interligados eram incrustados de neve, formando filigranas brancas como se um guardanapo estive jogado casualmente sobre suas costas rochosas. Eu fiquei sem fôlego – pela primeira vez não por causa da turbulência. Como colocou Tappan, da Homer Air, nos voos panorâmicos, “você está lá fora na natureza selvagem, em um ambiente realmente remoto; você é um convidado na casa de alguém”.
Vista de cima do Grewingk Glacier, no AlascaSe você for
Há várias pequenas companhias aéreas no Alasca, oferecendo uma série de itinerários, desde voos diários até excursões com duração de uma semana. A Alaska Air Carriers Association (alaskaaircarriers.org) é um bom lugar por onde começar a procurar uma viagem de voo panorâmico, mas há ainda mais operadoras lá.
A Homer Air (800-478-8591; homerair.com) fica em Homer, na Baía de Kachemak, por si só um ótimo destino para avistar águias-carecas. Ela oferece uma viagem a 40 geleiras pela rota do campo de gelo de Harding (US$ 166 a US$ 355 por pessoa, dependendo da duração e do número de pessoas), assim como viagem para avistar vulcões e vida selvagem, de cerca de seis horas, com pouso para visitar ursos (US$ 700 por pessoa).
A Lake Clark Air (888-440-2281; lakeclarkair.com) é uma companhia aérea familiar especializada na área do Parque Nacional do Lago Clark, a cerca de uma hora de voo de Anchorage. Um passeio começa com uma viagem com belas vistas com partida de Anchorage, voando pela Passagem do Lago Clark, mais almoço e um pequeno voo panorâmico pelos arredores (US$ 400 por pessoa). A família também dirige a Farm Lodge, na remota Port Alsworth, onde você pode ficar hospedado e realizar voos diários de excursão para pescar, avistar ursos e caminhar em lagos escondidos (até US$ 12 mil por pessoa por semana, dependendo do número de atividades).
A Talkeetna Air (800-533-2219; talkeetnaair.com), localizada a cerca de 160 quilômetros ao norte de Anchorage, no Aeroporto Estadual de Talkeetna, possui a habilidade (e licença) para pousar nas geleiras do Parque Nacional Denali. Os participantes podem ver os picos do Monte McKinley como apenas um alpinista poderia. A empresa também fornece serviço de transporte para esquiar e escalar no interior. (Grand Denali Tour, duas horas, custa US$ 280 por pessoa, e com pouso na geleira custa US$ 355 por pessoa).
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Fonte: Sarah Maslin Nir (The New York Times via UOL Viagem) - Tradutor: George El Khouri Andolfato - Fotos: Scott Dickerson/The New York Times