Denise França relatou que seu filho, que possui paralisia cerebral, teve que viajar no chão do avião.
O pequeno José Miguel, cinco anos, que sofre de paralisia cerebral, viaja do aeroporto de Várzea Grande para o aeroporto de Brasília duas vezes ao ano. De lá, ele segue para o Hospital Sarah Kubitschek, local onde realiza tratamento médico.
Acompanhado de sua mãe, a empresária e professora de dança Denise França, e de sua cuidadora, Ivonildes Matos, ele consegue se manter seguro e confortável na aeronave com o auxílio de uma cadeira especial que disciplina seu corpo, pois não tem controle sobre o tronco e adora brincar e mexer com as coisas como toda criança de sua idade.
Mas não foi isso que ocorreu, segundo a empresária, no dia 21 de julho deste ano, quando os três embarcaram no Voo AD 2429, da companhia Azul Linhas Aéreas.
Em ação de danos morais impetrada contra a empresa aérea, Denise França relatou os alegados constrangimentos sofridos por ela, a cuidadora e, principalmente, por seu filho.
O descaso teria começado no guichê do check-in, quando Denise solicitou à atendente que José Miguel viajasse nas primeiras poltronas, que, por serem próximas da entrada, facilitariam o desembarque dele. No entanto, a representante da Azul informou que tais poltronas já haviam sido vendidas por preços superiores.
Eles então se acomodaram no fundo do avião, ocasião em que Denise pediu aos comissários que disponibilizassem uma cadeira especial ao seu filho ou algum equipamento que o deixasse mais confortável, “cuja solicitação foi ignorada, pois, os mesmos não tinham nem ideia do que fazer perante o menor especial, o que por mais uma vez, causou constrangimento a autora e seus acompanhantes”.
Sem alternativa, a empresária tentou segurar José Miguel na cadeira comum, mas ele escorregou e caiu, pois a doença o impede de ficar com o corpo ereto. Novas tentativas foram feitas, inclusive a de amarrá-lo ao cinto, todavia, ele novamente caiu.
Denise e a cuidadora também tentaram acomodá-lo no colo, segurá-lo nos braços, mas nenhuma tentativa foi eficaz e José Miguel teve que viajar deitado no chão “sem nenhum equipamento de segurança, sujeitando-se a risco de morte, caso ocorresse uma turbulência durante o voo, o que graças à interferência divina não ocorrera”.
“Ele foi deitado no chão do avião. Porque eu e a babá não conseguimos aguentar de dor no braço. Eu já estou com desvio na minha cervical, que pode ser também pelo peso, porque eu carrego a cadeira, carrego ele. Antes ele era menor, então controlava mais ele, ia no colo, mas agora ele já está muito pesado. Quando ele estiver com oito, nove anos, como ele vai sentar? É um desrespeito com quem possui deficiência”, criticou Denise, em declaração ao MidiaJur.
Chegado o momento da aterrissagem, a empresária pediu ajuda para evitar que seu filho se machucasse, sendo novamente ignorada pelos comissários, de acordo com a ação. Ela recebeu auxílio de um idoso, que cedeu a cadeira próxima à entrada, mais confortável e segura.
Mais um obstáculo foi encontrado após o pouso em Brasília. Não havia corredores de desembarque ou rampas que ligassem a aeronave ao terminal. Denise desceu os degraus do avião com seu filho no colo e subiu os degraus do micro-ônibus na mesma situação, “mais uma vez sem receber auxilio ou uma cadeira de rodas”.
“Crueldade”
Na ação, a defesa da empresária alegou que as condutas adotadas pela companhia Azul foram “imorais e irresponsáveis”, pois além de contrariar as normas do sistema aéreo, causaram “o abalo moral, o sofrimento, o constrangimento, sofridos pela promovente e seu filho especial, diante de tamanha crueldade”.
“Posto isso, mais do que justa é necessária à condenação da promovida em reparar os danos morais causados a autora, para que sirva de meio pedagógico, para que a empresa promovida não cometa tais atrocidades com outros passageiros especiais”, diz trecho da acusação.
A advogada de Denise, Cristiane de Oliveira Gomes, ressaltou que a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) determina às empresas aéreas a disponibilização de equipamento adequados aos portadores de necessidades especiais, tanto para acomodação no avião quanto para embarque e desembarque.
“No entanto, atualmente, os consumidores diante de sociedades empresárias de grande porte são totalmente hipossuficientes, pouco importando a utilização dos serviços com maior ou menor frequência. O tratamento dispensado aos consumidores é sempre diverso do esperado e preconizado na Carta Constitucional, inexistindo eficiência, transparência, boa-fé, cordialidade nas relações com os usuários dos serviços prestados por concessionárias de serviço público”, argumentou Cristiane Gomes.
Além da condenação em R$ 28,9 mil pelo dano moral causado, a advogada pediu que fosse oficiado o caso à ANAC, no intuito de a agência impedir que a companhia aérea continue a praticar tal conduta.
Outro lado
No primeiro contato com a empresa Azul, a secretária da Central de Atendimento se negou a informar/transferir a ligação para alguém responsável que pudesse esclarecer o caso em nome da empresa, assim como explicar qual é o procedimento adotado pela companhia para atender os portadores de necessidades especiais. Segundo ela, o pedido só poderia ser aceito com o código da passagem, independentemente da reportagem possuir o nome completo da autora, a data, hora e número do voo.(Protocolo 4917701433202150).
Em contato posterior, outra profissional informou que irá abrir um procedimento com as informações repassadas pela reportagem e que a empresa responderá as questões solicitadas em prazo máximo de cinco dias (Protocolo 4917701433194555).